O trabalho de cientistas sobre as sequelas da exposição ao novo coronavírus tem resultado em uma lista grande e diversa de complicações. Os infectados analisados, porém, são, geralmente, adultos, idosos e crianças. Faltam dados sobre o que acontece quando o primeiro contato com o Sars-CoV-2 ocorre ainda no útero materno.
Um grupo de cientistas de instituições espanholas se dedica a investigar os efeitos dessa condição, e uma dos primeiros resultados a que chegaram é que os recém-nascidos de mulheres que tiveram Covid-19 durante a gestação podem apresentar problemas na função motora já nas primeiras semanas de vida.
A equipe analisou os recém-nascidos e 42 mulheres, sendo que 21 testaram positivo para a doença durante a gravidez e 21, não. Todos foram atendidos no Hospital Universitário Marqués de Valdecilla, em Santander. As mulheres foram submetidas a uma série de exames durante e após a gestação, como avaliação hormonal e bioquímica (níveis de cortisol, resposta imunológica etc.), testes salivares, e de respostas de movimento, além de responderem a questionários psicológicos.
Para a análise dos bebês, adotou-se a Escala de Avaliação Comportamental Neonatal (NBAS), que avalia a capacidade de movimento e o comportamento. Os resultados mostraram que os bebês nascidos de mães que foram infectadas pelo Sars-CoV-2 apresentaram maiores dificuldades em relaxar e adaptar o corpo quando estavam no colo, quando comparados aos que nasceram de mulheres que não tiveram Covid-19. Além disso, as crianças do primeiro grupo tendiam a apresentar maior dificuldade em controlar os movimentos da cabeça e dos ombros.
As complicações foram detectadas na sexta semana após o parto e se mostraram mais acentuadas quando a exposição ao vírus se deu no fim da gestação. “Descobrimos que certos elementos da medição NBAS foram alterados em bebês de 6 semanas que foram expostos ao vírus Sars-CoV-2. Efetivamente, eles reagem de maneira um pouco diferente ao serem segurados ou abraçados”, resume, em comunicado, Águeda Castro Quintas, pesquisadora da Universidade de Barcelona e uma das autoras do estudo.
Segundo a pesquisadora, o grupo conduziu os testes de forma “especialmente sensível”. Cada mãe e bebê foi examinado de perto por médicos com treinamento especializado nas áreas avaliadas e nos testes aplicados. “Esse é um projeto em andamento e estamos em um estágio inicial (…) Não sabemos se esses efeitos resultarão em problemas de longo prazo. A observação duradoura vai nos ajudar a entender isso.”
Líder do projeto, Ayesa Arriola faz ponderação semelhante. “Nem todos os bebês nascidos de mães com Covid-19 apresentam diferenças de desenvolvimento neurológico, mas nossos dados mostram que o risco é maior, em comparação àqueles não expostos ao coronavírus no útero. Precisamos de um estudo maior para confirmar a extensão exata da diferença”, enfatiza.
Os resultados já obtidos foram apresentados no 30º Congresso Europeu de Psiquiatria, que termina hoje, em Budapeste, na Hungria.