O ministro da Educação, Milton Ribeiro, entregou sua carta de demissão ao presidente Jair Bolsonaro (PL), em reunião no Palácio do Planalto na tarde desta segunda-feira (28). Ele deve ser exonerado do cargo por conta do escândalo do “gabinete paralelo” no MEC.
No lugar dele deve assumir o secretário-executivo do MEC, Victor Godoy. Segundo fontes, foi o próprio ministro que tomou a iniciativa com o objetivo evitar ainda mais desgaste no governo.
Milton Ribeiro avalia os efeitos da sua renúncia nas investigações da Polícia Federal envolvendo supostos pedidos de propinas feitos por pastores lobistas do MEC. Segundo fontes, a carta de afastamento foi redigida ao longo do fim de semana por um aliado de Bolsonaro e de pastores evangélicos.
Inicialmente, a expectativa era de que ele pedisse apenas um licenciamento enquanto durassem as investigações sobre o caso. Até o fim da última semana, o chefe do Executivo vinha resistindo à ideia de trocar novamente o comando do MEC, apesar da crise. Em live na quinta-feira (24), o presidente disse acreditar na idoneidade do ministro.
“Se o Milton estivesse armando não teria colocado na agenda aberta ao público. O Milton, eu boto minha cara no fogo por ele. Estão fazendo uma covardia. A Polícia Federal, ontem eu pedi para abrir o procedimento para investigar o caso também. Tem gente que fica buzinando: ‘Manda o Milton embora que a gente tem alguém pra indicar aqui’. Duvido botar para o público o nome, não faz isso porque se der errado a culpa é minha”, declarou.
Leia a íntegra da carta:
Desde o dia 21 de março minha vida sofreu uma grande transformação. A partir de notícias veiculadas na mídia foram levantadas suspeitas acerca da conduta de pessoas que possuíam proximidade com o Ministro da Educação.
Tenho plena convicção que jamais realizei um único ato de gestão na minha pasta que não fosse pautado pela correção, pela probidade e pelo compromisso com o erário. As suspeitas de que uma pessoa, próxima a mim, poderia estar cometendo atos irregulares devem ser investigadas com profundidade.
Eu mesmo, quando tive conhecimento de denúncia acerca desta pessoa, em agosto de 2021, encaminhei expediente a CGU para que a Controladoria pudesse apurar a situação narrada em duas denúncias recebidas em meu gabinete. Mais recentemente, em ___, solicitei a CGU que audite as liberações de recursos de obras do FNDE, para que não haja duvida sobre a lisura dos processos conduzidos bem como da ausência de poder decisório do ministro neste tipo de atividade.
Tenho três pilares que me guiam: Minha honra, minha família e meu país. Além disso tenho todo respeito e gratidão ao Presidente Bolsonaro, que me deu a oportunidade de ser Ministro da Educação do Brasil.
Assim sendo, e levando-se em consideração os aspectos já citados, decidi solicitar ao Presidente Bolsonaro a minha exoneração do cargo, com a finalidade de que não paire nenhuma incerteza sobre a minha conduta e a do Governo Federal, que vem transformando este país por meio do compromisso firme da luta contra a corrupção.
Não quero deixar uma objeção sequer quanto ao meu comportamento, que sempre se baseou em pilares inquebrantáveis de honra, família e pátria. Meu afastamento do cargo de Ministro, a partir da minha exoneração, visa também deixar claro que quero, mais que ninguém, uma investigação completa e longe de qualquer dúvida acerca de tentativas deste Ministro de Estado de interferir nas investigações.
Tomo esta iniciativa com o coração partido, de um inocente que quer mostrar a todo o custo a verdade das coisas, porém que sabe que a verdade requer tempo. Sei de minha responsabilidade política, que muito se difere da jurídica. Meu afastamento é única e exclusivamente decorrente de minha responsabilidade política, que exige de mim um senso de país maior que quaisquer sentimentos pessoais.
Assim sendo, não me despedirei, direi um até breve, pois depois de demonstrada minha inocência estarei de volta, para ajudar meu país e o Presidente Bolsonaro na sua difícil mas vitoriosa caminhada.
Brasil acima de tudo!!! Deus acima de todos!!!”
Entenda o caso
Em áudios divulgados pela imprensa, na semana passada, Milton Ribeiro afirmou priorizar pastores aliados na liberação de recursos do Fundo Nacional da Educação (FNDE).
Na gravação, Ribeiro ainda cita que o favorecimento é um pedido expresso do presidente Jair Bolsonaro. “Minha prioridade é atender primeiro aos municípios que mais precisam e, segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar.”
O “pastor Gilmar” citado no áudio é Gilmar Silva dos Santos, 61 anos, nascido em São Luís (MA), que comanda o Ministério Cristo Para Todos, uma das várias ramificações da igreja Assembleia de Deus, em Goiânia (GO).
Milton Ribeiro virou alvo de inquérito da Polícia Federal por suspeita de favorecer pastores na liberação de verbas para prefeituras. A apuração foi autorizada pela ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF). Na quinta-feira à noite, a corporação já tinha instaurado outra investigação — por solicitação da Controladoria-Geral da União (CGU) — que tem como alvo os líderes evangélicos Gilmar Santos e Arilton Moura.
Centrão quer a vaga
A indicação do secretário-executivo para ser ministro partiu de Milton Ribeiro e foi comunicada ao presidente Bolsonaro ainda no final de semana. Contudo, outros dois nomes, o presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Marcelo Ponte, e o diretor de Ações Educacionais também do Fundo, Garigham Amarante Pinto, são cogitados para assumir o cargo.
Os dois nomes são ligados ao Centrão. Ponte foi chefe de gabinete do ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, presidente licenciado do PP. Garigham foi assessor do PL, partido ao qual Bolsonaro é filiado. Ambos deixaram as legendas para assumir os cargos no FNDE.
A exoneração de Milton Ribeiro, que não é filiado a qualquer agremiação política, abre brecha para que o Centrão ocupe o MEC. O interesse do bloco partidário está no volume do orçamento e na capilaridade de ações da pasta nos municípios do país.